A Inveja já nasceu invejando todos os predicados.
Não agüentava a beleza de Maria , a inteligência de Sabrina, a naturalidade de Virgínia, a espertezade Marlene e assim por diante.
Substantivos também a incomodavam, principalmente, quando eram alvo de elogios, como o sorriso do Carlinhos, o carrinho da Flavinha, o namorado de Tereza e o corpo da Bernadete.
Tudo era demais para seu bom coração e para a sua grande e falsa modéstia à parte.
O seu veneno era conhecido e reconhecido pelos amigos, desde os tempos de escola.
Sem dúvida, tratava-se de seu único e maior potencial.
Possuía uma grande qualidade: a de tomar conta da vida de todos que a cercavam.
Diariamente, anotava informações sobre o queandavam fazendo e registrava, mentalmente,tudo o que ouvia. E, cada vez mais, ficava popular a sua memória de elefante.
Trabalho era o que não faltava. Mesmo que algum amigo ficasse distante por um período longo, não tinha problema: Inveja, em poucos minutos, conseguia pô-lo a par de todos os acontecimentos , de forma elefantal.
Odiava gente besta. E, por esse motivo, nas ocasiões em que citavam um fulano que havia realizado uma façanha, tratava de lembrar a todos o que esse fulano não tinha conseguido fazer.
Era sua forma de contribuição à sociedade.
Detestava o sucesso de alguém.
Ora, porque alguém deveria fazer alguma coisa sozinho? O grupo é mais forte. A união faz a força e uma andorinha nunca fez verão.
Com esses exemplos eargumentos, cuidava para não permitir a entrada ou permanência no grupo de quem quisesse aparecer demais.
Fazia questão de logo esvaziar qualquer balão que pudesse voar mais alto.
Inveja apreciava suas próprias virtudes... E como!
Gostava de enumerá-las, em altos e bons tns, o que a atrapalhava um pouco.. O tempo paracontá-las era tanto, que a impedia de realizá-las.- Nossa! Essa gente é um grande papo furado!
Uma enorme perda de tempo, pensava. Fazia marcações em determinadas pessoas - possíveis futuras ameaças.
Não ostensivamente, é claro. Sabia ser sutil. Primeiro, seduzia a vítima, em seguida,abria o segundo ato: observava. Ao descobrir seus pontos fracos, dava o bote, certeiro e rasteiro. E menos um para contar histórias...
Na maioria das vezes, não se dava a muito trabalho. Usava todo o seu veneno, destilado homeopaticamente, de preferência pelos ouvidos daqueles que estão comos próprios sempre a postos.
O efeito, previsível e infalível, era imediata e voluntariamente absorvido, a ponto de ser levado pela corrente sanguínea às maçãs do rosto que podiam ficar pálidas ou afogueadas,em pouquíssimos minutos.
Em casos de impacientes ou dominadores obtinha agravantes colaterais. Discussão era o mais freqüente; mas tinha tambémas brigas, os tiros com e sem mortes, até a guerra. Pena que, na maioria, o agravo era mais brando. Passava do ouvido para a barriga ou cabeça e dava apenas uma dorzinha.
Paciência...Inveja quando queria era imbatível. Ninguém podia com ela. Armava aquela confusão e, assistindo de camarote, ficava se contorcendo de rir. A última da Inveja é que mordeu a própria língua. Ao trincar os dentes com raiva, teve um choque anafilático-colérico e morreu fulminada.
Em sua lápide alguém escreveu:
"Aqui jaz a Inveja - medíocre, meditadora e mediúnica do alheio, real exemplo de grandesfeitos em toda a História..."
Acompanhando os dizeres, via-se uma cobrinha ingênua e sorridente. Eu estava acabando de contar para duas amigas que o porteiro do Zoo e o filho juram, de pés juntos, que acabaram de ver a Inveja na esquina. Pode?
E uma delas, a mais simpática, aquela que não consegue parar de mostrar os lindos dentes e a língua afiada, falou:
- Vocês falam de reencarnação, ressurreição, sei lá mais o quê. O que vocês não sabem é que as cobras, simplesmente, mudam de pele.
E saiu rindo da gente...
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